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Talvez quando a senilidade aparecer de mansinho eu me detenha e por isso tente ler-te o corpo nú. Pode ser esse o meu desígnio e imaginar isso necessitará de muita destreza, coisa que ainda não tenho. Mas, por agora, tempo entre as mãos é coisa que eu disponho e tenciono sentar-me neste ponto. Olhar para trás em vez de ver em frente.

Por agora, quero apenas esse caminhar profano, deixando-me na morte latente de quem se torna incapaz de proferir outros sons que não sejam os de uma criatura curva, fora da luz do teu rosto.

 

O facto é que a vida resume-se muitas vezes ao fumo branco do cigarro que se prende aos lábios. As questões essênciais da existência? A roupa amarrotada, o cabelo desnivelado e desfeito. Gosto das melodias que dizem coisas terriveis, da garrafa vazia e da súbita vontade de dançar. Por mais incapaz que seja. E por falar nisto que se chama vida vivida, preciso de me rir, por mais duro que seja esse sorriso. Por mais linhas que se cravem à volta dos meus olhos, dá vontade de fazer uma vénia aos desespero alheio, tudo como manda a regra elementar da educação; se preciso fôr tentar ajeitar o cabelo e não ser bem sucedido. Já agora, a barba e as patilhas já se rapavam, não?

Acredito que se fosse crente, acharia que o diabo criou o mundo enquanto deus dormia. Seria uma explicação muito mais aceitável, creio, para este meu despudor pela escuridão e sombras.

 

 

 

 

 

Sei porque razão a maioria das pessoas se recusa a olhar os outros nos olhos: porque transparece toda a verdade das suas almas. Toda a sujidade que habita as suas miseráveis vidas. Somos todos da mesma natureza e por isso não adianta justificar o injustificável.

Já deixei de me importar com o apodrecimento da minha alma. Antes a anticipo, porque já percebi que é na escuridão que posso melhor conhecer os outros; os que não olham os meus olhos, infantilmente sonhando a mentira inocente. No fundo, apenas perturbamos a vida de algumas- poucas - pessoas. Tal é a nossa insignificância. Se todos pudessem olhar de frente, olhos nos olhos, mais depressa seria aceite a verdade da nossa inutilidade no universo tão vasto e tão indiferente.

 

Não compreendo porque somos obrigados a fazer certas coisas neste mundo. Porque razão devemos ter amigos em quantidade, ter esperança do melhor que nunca vem, sonhos transcendentes que se tornam pó  de cada vez que olhamos em volta.

Por vezes, não raras vezes, creio que a verdadeira solução seria retirar-me para o canto mais longínquo do mundo, onde terminaria o meu dia sem barulhos, razões para viver e complicações para explicar.

Dizem que vivemos dias negros, creio que nunca deixamos de os viver. Apenas usamos as máscaras que, aparentemente, os tornam claros e cheios de esperança. Se eu pudesse recusaria as ambições e cultura dos meus avós. Sei que perderia tudo e nada ganharia, mas que me importa? O que poderá dar-me esta vida a ganhar que eu já não tenha conquistado pela força da dôr e do desapontamento?

 

Sem poder exprimir por sons, estes são pensamentos transversais ao que resta dos dias vividos. Um perfeito momento. Aquele momentâneo lapso da toda a racionalidade que me faz desejar um dia regressar a casa. Mesmo que não saiba a exacta localização desse local de reverente paz, um dia gostaria de lá chegar. Talvez um sinal destes tempos ou uma estranha mudança na luz, torna-me sedento de estar em casa. Seja como for, casa será aquele sereno momento de boas-vindas, a familiaridade do beijo de compreenção e o calor exprimido pelos que sentiram a minha falta. Acima de tudo, casa será a expressão clara e cristalina das palavras de quem se inquietou com a minha longa ausência e verdadeiramente teve saudades. Quem acha que tudo irá finalmente melhorar, agora que regressei.

Sei ser  a minha casa, pois o outono será brilhante e ameno, pleno daquela promessa misteriosa e sem máguas. E nas ruas vou sentir-me acompanhado. Não perdido e em questão. Serão como sempre pensei que fossem e desde o início quis conhecer através dos meus próprios olhos.

 

Lamento, uma vez mais, não poder partilhar o optimismo de ano novo. Porque não acredito que irá ser diferente, porque sei que irá ser igual aos anteriores. Porque a raça humana não se arrepende e sei que apenas podemos mudar a nível individual.

Dedico a 2014 uma música que lhe vai assentar perfeitamente!

 

 

 




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