Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]



 

 " The children build coffins
With hammers and nails
They don't build ships
They have no use for sails"

D:VS

Uma triste conclusão que todos os dias se revela na minha vida é que me sinto mais vivo no mar do que em terra. Não me iludo, claro. Viajar por terra e pousar os pés pela primeira vez em solos desconhecidos, respirar o ar e tentar absorver o que me rodeia é algo absolutamente primordial e onde assento muitos dos meus sonhos. Porém, nadar abaixo da superfície é um catalisador de existência que me consome todos os dias. E quando não consigo nadar, contactar com a água, torna-se punitivo e desgastante. Porque nada se pode comparar à viagem interna que me percorre quando deslizo debaixo da água. Nadar no meio do gelo grosso e denso, onde por vezes a luz apenas entra de forma tímida e a escuridão se torna tão intensamente senhora que mais não se pode fazer do que deixar que nos abrace. Porque já me disseram, sei que os meus olhos se tornam imensos pelo assombro e são muitas as vezes que deixo outros em aflição porque deixam de me ver ou ouvir no meio do gelo escuro. Sei que se torna difícil entender, sei que sim. Mas para mim, bem cá dentro, consigo sentir-me vivo e como fácil será se um dia quiser deixar-me levar por uma verdadeira mãe. Uma euforia desmedida e a sensação de pertença tão pulsante deixa-me quase indefeso. Mesmo sabendo que aquela escuridão e aquele gelo poderiam ser o meu mundo. Poderiam. E quando subo à superficie, enquanto os outros riem e se alegram eu executo um mecanismo que durante anos desenvolvi: controlo os tremores que me percorrem o corpo de cima a baixo. Cerro os dentes e só quem muito bem me conhece é que consegue observar a minha luta para não tremer convulsivamente. Só não consigo controlar o olhar, que se desloca de lado para outro e a face que estremece de forma quase imperceptível. Porque me sinto orfão e tivesse sido afastado à força de onde pertenço.

Todos os dias me espanto com a incapacidade de reconhecimento, pela infeliz falta de conhecimento de um facto único: que somos pó de estrelas. Por isto é impossível conceber que o universo se importe connosco. Que exista uma entidade pesando o nosso destino ou governando a nossa miserável existência. Tudo o que nos compõe pertence ás estrelas e não é pura verdade que o nosso ADN não passa de nitrogénio?  Que o cálcio dos nossos dentes, o ferro do nosso sangue e outros minerais que habitam a nossa comida, tudo isto não faz parte do interior das estrelas em queda? Capazes de actos tão belos e ao mesmo tempo sonhadores de pesadelos horríveis e corroídos porque a solidão, o estar fora de tudo, não se consegue afugentar. Apesar de habitarmos um universo tão vasto, de permanentemente procurarmos algo e apesar de necessitarmos desesperadamente da companhia de outros, não consigo explicar porque razão eu acho que nasci vagabundo explorador e ainda não consegui deixar de o ser.

Tags:

 "The river only brings poison
The well brings nothing but tears
Nothingness becomes the shadow
The shadow turns into me ..."

D:VS

Tudo tem dependido do toque. Para mim torna-se muito difícil poder avaliar o que sinto em relação a outra pessoa sem poder tocar. Que é também, sentir. Muitas vezes, por todos o segredos mais profundamente guardados e mesmo na mais intensa vontade de permanecer numa penumbra de esquecimento, é pelo tocar que regresso à superfície. Por razões que a minha razão não alcança, talvez porque insisto desesperadamente em tentar tudo reproduzir por palavras, explicar o vazio preenchido pelo toque é tão terrivelmente insustentável que sucedem dias e noites em que não consigo afastar uma apatia insalubre. E só quando não existe o toque de uma pele, a falta do respirar que alimenta os medos e desassossega a alma mais resistente, é que temos a cruel noção do vazio que existe e povoa a nossa alma e existência. O toque afasta o medo de não existir, creio eu. Mesmo que os dias sejam longos e as noites se estendam por saudades consumidas em antecipação. Como qualquer outra criatura que nada obtém sem marcas profundas, aprendi a beber o seu toque aos poucos e sem pressa.

Tags:




Arquivo

  1. 2024
  2. JAN
  3. FEV
  4. MAR
  5. ABR
  6. MAI
  7. JUN
  8. JUL
  9. AGO
  10. SET
  11. OUT
  12. NOV
  13. DEZ
  14. 2023
  15. JAN
  16. FEV
  17. MAR
  18. ABR
  19. MAI
  20. JUN
  21. JUL
  22. AGO
  23. SET
  24. OUT
  25. NOV
  26. DEZ
  27. 2022
  28. JAN
  29. FEV
  30. MAR
  31. ABR
  32. MAI
  33. JUN
  34. JUL
  35. AGO
  36. SET
  37. OUT
  38. NOV
  39. DEZ
  40. 2021
  41. JAN
  42. FEV
  43. MAR
  44. ABR
  45. MAI
  46. JUN
  47. JUL
  48. AGO
  49. SET
  50. OUT
  51. NOV
  52. DEZ
  53. 2020
  54. JAN
  55. FEV
  56. MAR
  57. ABR
  58. MAI
  59. JUN
  60. JUL
  61. AGO
  62. SET
  63. OUT
  64. NOV
  65. DEZ
  66. 2019
  67. JAN
  68. FEV
  69. MAR
  70. ABR
  71. MAI
  72. JUN
  73. JUL
  74. AGO
  75. SET
  76. OUT
  77. NOV
  78. DEZ
  79. 2018
  80. JAN
  81. FEV
  82. MAR
  83. ABR
  84. MAI
  85. JUN
  86. JUL
  87. AGO
  88. SET
  89. OUT
  90. NOV
  91. DEZ
  92. 2017
  93. JAN
  94. FEV
  95. MAR
  96. ABR
  97. MAI
  98. JUN
  99. JUL
  100. AGO
  101. SET
  102. OUT
  103. NOV
  104. DEZ
  105. 2016
  106. JAN
  107. FEV
  108. MAR
  109. ABR
  110. MAI
  111. JUN
  112. JUL
  113. AGO
  114. SET
  115. OUT
  116. NOV
  117. DEZ
  118. 2015
  119. JAN
  120. FEV
  121. MAR
  122. ABR
  123. MAI
  124. JUN
  125. JUL
  126. AGO
  127. SET
  128. OUT
  129. NOV
  130. DEZ
  131. 2014
  132. JAN
  133. FEV
  134. MAR
  135. ABR
  136. MAI
  137. JUN
  138. JUL
  139. AGO
  140. SET
  141. OUT
  142. NOV
  143. DEZ
  144. 2013
  145. JAN
  146. FEV
  147. MAR
  148. ABR
  149. MAI
  150. JUN
  151. JUL
  152. AGO
  153. SET
  154. OUT
  155. NOV
  156. DEZ
  157. 2012
  158. JAN
  159. FEV
  160. MAR
  161. ABR
  162. MAI
  163. JUN
  164. JUL
  165. AGO
  166. SET
  167. OUT
  168. NOV
  169. DEZ
  170. 2011
  171. JAN
  172. FEV
  173. MAR
  174. ABR
  175. MAI
  176. JUN
  177. JUL
  178. AGO
  179. SET
  180. OUT
  181. NOV
  182. DEZ


topo | Blogs

Layout - Gaffe