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Certos locais de escrita são como pequenas candeias que iluminam as noites mais escuras, por vezes fora da nossa rota, apenas visíveis aos que caminham e pressentem os seus ventos distantes. Porque nesses locais de escrita a palavra soa-me a outro vento que poucas vezes senti. É estranha esta virtude que mora nos dedos de certos, a estranha capacidade dos que caminham entre labirintos sem temor de locais ermos e escuros, o seu desapego - este mesmo sabor - sempre foi para mim uma fonte de obsessão, uma porta para o outro lado. 

Descobri que em certos locais de escrita as minhas chaves de portas são forjadas no metal cristalino da Saudade e da Nostalgia, que não interessa se é manhã ou entardecer, sequer se é noite de chuva. Que alguém não olhou o monstro em mim e simplesmente estendeu palavras escritas como dedos esticados entre sombras - sem medo dos dentes escondidos.

Certos locais de escrita quando trancam as suas portas deixam no ar a memória de uma casa iluminada por um sol terno do inicio de Outono, banhada em claridade aconchegante. Apetece aspirar os seus sonhos e passos distantes, deixando cintilar a certeza de que uma nova solidão mora agora nesses raros locais.

O caminhante carrega essas memórias fechadas em si. 

E é estranho o seu sabor.

(Fleuma)

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"Enquanto o padre, esse negador, caluniador e envenenador da vida por profissão for aceite como uma variedade de homem superior, não poderá haver resposta à pergunta: O que é a verdade? A verdade já foi posta de cabeça para baixo quando o advogado do nada foi confundido com o representante da verdade.", F. Nietzsche

 

 

 

 

Friedrich Nietzsche

 

 

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Archie Battersbee

 

“O médico deve acalmar os sofrimentos e as dores não apenas quando este alívio possa trazer cura, mas também quando pode servir para procurar uma morte doce e tranquila.” - Sir Francis Bacon

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Lembras-te, nas raras vezes em que a minha ousadia se atreveu a romper o silêncio? Quando tudo o que escrevia eram sombras, escuridão e abismos, tu, quase branda, nesse teu acreditar num mundo melhor, aceitavas os meus trejeitos lúgubres, talvez porque, no fundo, me achavas estranho e perdido em algo, e incapaz de me submeter a essa racionalidade que insistes ser a tua maior força.

É estranho, para mim, agora, provar o ácido do teu pessimismo, sentir-te entre as tuas sombras e medos. É estranho porque te desconheço forças para caminhares orgulhosa nestes dias onde a Ordem é o Caos organizado. Mais estranho, porque nada sei das tuas lâminas de sobrevivência, mas pressinto o teu espanto perante um mundo feito de horrores sombrios, buracos sem sol e bestas cegas.

Poderia romper o silêncio porque sei que sempre tive razão. 

Mas não. Não é isso que eu quero.

Também não quero testemunhar-te incrédula. Muito menos escutar a tristeza a escorrer pelas agruras da tua dúvida, enquanto se vão esmagando os tronos dourados da paz e da consciência.

Para isso estou cá eu. Sobrevivente da explosão. Pregador da Queda. Incapaz de confiar no mundo.

Não.

De ti, quero o pequeno, longínquo e frágil raio de luz, que vampirizo para caminhar entre sombras. Quero que sejas diferente, mesmo que sintas ser uma idiotice plena a confiança nos outros; mesmo perante a evidência da minha razão e cinismo, quero que me arrastes por outros labirintos. Quero a tua companhia e que sintas o sabor da textura das minhas escarpas, da persistência da tua preocupação contra a minha lógica. 

Ofereço-te um catecismo de um perdão que me esqueci. Perdido. Um poema amargo sobre as cinzas deste mundo. Um fim sem fanfarra.

Oferece-me a tua esperança. Mesmo que seja uma bofetada no meu rosto orgulhoso. Um fragmento a cintilar junto ao abismo.

É isso. 

Um rasgo apenas. Uma fenda. Uma saída. Mesmo que tenha o sabor da ilusão e do sonho.

 

 

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(999)

 

"O encontro de duas personalidades assemelha-se ao contacto de duas substâncias químicas: se alguma reacção ocorre, ambos sofrem uma transformação." - Carl Jung

 

O desvelo contido é uma mão que se estende para auxiliar os cegos entre as paredes dos labirintos. Uma arte que, em escassas criaturas, nasceu logo no primeiro respirar, e nunca mais abandonará  a sua existência. Assenta nela como uma coroação, e se não formos estupidamente ignorantes, é possível notar um brilho de luz no meio da tempestade. Por vezes, parece desvanecer-se como os sonhos ao acordar. Mas não: às vezes esconde-se, tímida, como quem se envergonha de uma virtude sua e que a maioria não tem. Envergonhada, cruza os braços junto ao peito, como se merecedora de uma qualquer punição.

E são estas estranhas criaturas que, secretamente, também amam as sombras e conseguem nadar entre elas, como se  fossem, afinal, parte desse mundo, despertando os sonhos e os desejos mais contidos; escondendo as horas que matam, em lugares encantados - apenas seus. É inefável a beleza dos olhos abertos destes bizarros seres - insistem na esperança! Confiam em fantasmas. Confiam em sonhos. Estranhamente... parecem confiar nessa coisa a que chamam coração, como uma bússola de sentimentos, e não apenas um órgão que bate para a vida. São a irritante frustração dos cínicos insolentes, porque, entre os esconderijos reclinados do seu desvelo, afirmam que o poder do nosso Inferno existe apenas porque os seus prisioneiros insistem em sonhar com o Paraíso.

Gosto destas criaturas. Tão diferentes de mim. Tão fascinantes na sua capacidade de esperança.

 

 

 

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Desafio aceite.Espero ter correspondido?....*

 

Eu penso que ele se apaixonou por ela. Talvez demasiado. Mas sim. Foi isso. E não é idiota? Mas era como se a conhecesse de um outro lado. Como uma velha e querida amiga. O género de criatura a quem podia contar tudo, por pior que fosse, que nunca lhe voltaria as costas, continuaria a gostar dele - porque parecia que o conhecia como as palmas das mãos. Queria ir com ela e que ela reparasse nele mesmo quando se afastava naqueles passos que ele achava encantadores.

Recordo-me de os ver parados debaixo de um céu cor de chumbo numa manhã que convidava a pensamentos e fugas. Estavam os dois juntos e por instantes eu achei que ele tentava dizer-lhe algo; mas não sei. Nos olhos dele havia aquele brilho raro de quem parece amar algo profundamente e para toda a vida. No entanto,  sempre fiquei com a bizarra sensação de que ela nem sequer parecia estar ciente da sua presença.

 

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Imagina, por momentos, que faço meus os teus olhos; por instantes, a casa que é só tua, abre as portas e permite que eu entre, ainda que apenas entre sombras, quase desaparecendo da tua vista.

Imagina que viajo contigo dentro dos teus pensamentos mais escondidos, dormentes, apenas ouvidos por enigmas secretos, soletrados baixinho: como se  demasiado proibidos para que sejam proferidos em voz alta;  demasiado estrondosa.

Imagina.

... Que é demasiado claro lá fora. Que afinal, sempre estiveste demasiadamente dependente da luz que te aponta o caminho enquanto caminhas segura.

Imagina.

... Que te esqueceste de uma outra luz. Na tua própria casa. Do seu brilho primário rasgado por sombras e outros fantasmas. E pelos teus olhos, com as tuas mãos, vou saltando entre os raios brilhantes e caindo no conforto dos espaços escuros criados por palavras e pensamentos teus - alquimia de estranhas virtudes.

Imagina que para mim os teus olhos sejam os fragmentos onde bebo de ti e descanso entre caminhos; enquanto sonho o que sonhas.

Silencioso - porque é leve o teu sono. 

 

 

"O homem que não atravessa o inferno das suas paixões também não as supera."

Carl Jung

 

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A Morte em si nunca deveria ser temida. Um fim absoluto e sem retorno que não conseguimos vencer  porque se trata de uma inevitabilidade pragmática, cruelmente absoluta, implacável. É interessante, conseguir que o pensamento se unifique na órbita da inevitabilidade da Morte. E Estranho, que na Morte tudo se desfaça nos fumos amargos do Nada.

Talvez a Morte, ainda assim consiga trilhar as  estradas de mão dada com a eternidade, nessa maldita sina que nasce em nós, porque insistimos em recordar ideias, gestos e vozes; talvez a eternidade bata como batem os corações, pela incapacidade que temos de esquecer os que foram, e pelo sadismo pessoal de não deixar espaços vazios por preencher.

Temos medo do vácuo  da morte em nós. Creio.

A eternidade que inventamos desde a primeira golfada de ar é uma corrente de pensamentos entre cheiros e visões. E somos tão escravos dela! Somos tão indefesos às suas garras.

Porque é desta incapacidade para rasgar este acordo forçado com a eternidade imaginada pela mão da Morte, que nasce daquela criatura outrora resplandecente na sua teoria de felicidade em conjunto com uma outra, a  tragédia  de imaginarmos o para sempre. Como se justificam eternidades quando a outra criatura morre sem aviso? Como se justifica o mais profundo Vazio na alma, quando a  felicidade se esbate na orfandade? Onde  estão os poetas, os bardos da eternidade, quando se entra na casa, antes rodopiante de sons e estalar de gargalhadas, se percorrem corredores, se abrem portas de quartos e tudo está silencioso? Quando  sabemos exactamente onde vão jorrar os primeiros raios de sol da manhã, como estão alinhados os livros preferidos, como está inclinada a cadeira para o café da tarde.

A eternidade é mais dolorosa do que a Morte. Quem se apaga deixa em seu lugar o sabor sorumbático da solidão mais extrema, que nos força ao desespero de caminhar nas mesmas rotinas, estranhamente, devorando a nossa quietude.

Talvez o pior não seja a Morte. Talvez a dor não sejam as  escarpas onde perdemos a Voz do Fadista. Talvez o maligno sobreviva antes no peito de quem fica e recorda. Na falta de esquecimento de expressões e contornos.

Pode ser que Sam Harris esteja certo porque todos nós iremos sofrer a perda de alguém demasiado importante na nossa existência. E se calhar, por causa desta nossa incapacidade de aprender como os erros, insistamos na ideia de uma outra vida para além desta. 

E por isso decidamos não viver.

Catarse ...

 

Algumas palavras são como antigas fermentações mágicas. Por vezes, com a raridade do que é precioso e único, é possível ter um breve lampejo do latejar de quem escreve pensando. Um clarão momentâneo! Como se, naquele exato segundo, o reconhecimento, com as  duas mãos, virasse a nossa atenção para as palavras escritas. Palavras entre muitas outras palavras que se desviam de milhares de frases que nada dizem, iguais entre si.

Eu gosto de vampirizar estas singularidades como quem saboreia a emoção da revelação. É o pressentir de uma mão que se estende para mim e me oferece outros olhos, odores misteriosos e sons só possíveis de escutar enquanto vou viajando pela arquitetura das  frases. Consigo perfeitamente sentar-me ao lado de quem escreve e sentir a aragem dos dias ventosos; ou então caminhar com o calor do Sol; se calhar ajustar a mente infatigável a pormenores que me rodeiam, como um fantasma silencioso.

Existe uma centelha intensa na minha vontade de viajar. Continuo a viajar fisicamente porque sei que por muito que sonhe jamais me dará o mesmo prazer do viajante de muitos passos, mas o néctar de ler excertos de outras vidas e neles me reconhecer gera aquela embriaguez apenas reservada a uma rara elite de vampiros. Permito ser arrastado sem receio. Intruso sem culpa. Criatura treinada na arte dos que se baloiçam gentilmente na cadeira dos momentos esquivos em que pode realmente descansar a mente e o corpo.

Raro. Estranhamente embriagado. Aquele último e breve momento em que a mão estendida se afasta e consigo aquele muito suave sorriso  de reconhecimento.

Raro. Precioso. Necessário ao monstro.

 

 

 

 

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