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Recuso-me sempre a aceitar que haja quem se possa esquecer de prazeres tão pessoais ou tão intensos como a mera faculdade de rir. Tenho no entanto, reparado que as pessoas que conheço que mais riem são as mais solitárias. Seja porque estão sós ou porque aceitam certas noções como algo inato. Não sei justifica-lo. Mas é verdade. Existem pequenos e deliciosos prazeres esquecidos. Lamento que o sejam.
Testemunhar um sorriso em fases díficeis da nossa miserável existência é uma luz que cega. E como posso eu pensar de outra forma, quando alguém que se encontra nos confins da mais absoluta tristeza, se digna a sorrir. Tão levemente que me reduziu a escombros. Uma criatura que ao lado da cama de alguém cujo sofrimento físico e mental acompanhou todos os dias, sempre presente e vigilante, viu o médico desligar todas as máquinas que prendiam à terra. Uma a uma. O ventilador. Os batimentos cardiacos.
Não houve dramas ou gritos, perante algo há muito esperado. Apenas um baixar de cabeça tão imensamente primordial e digno que melhor homenagem de partida não se poderia esperar.
E um sorriso. Cansado e soterrado em agonia escondida. Ao mesmo tempo sentido e resignado.
A mim? Uma vez mais testemunhei algo que a minha mente não processa. Acho que nestas ocasiãoes nada se processa, a não ser a verdadeira utilidade de rir. Mas destroçou-me mais um pouco. Sim, mas apenas mais um pouco.
O sorriso nestas ocasiões é a maneira mais segura e firme de comprovar a tristeza. Não são as lágrimas ou os gemidos.
Um sorriso e uma cabeça baixa. E não vejo maior escuridão e solidão numa criatura.