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A razão porque nunca serei santo é exactamente porque nunca compreenderei o conceito em si. A santidade implica privação e obediência cega. Por muito que tentem convencer-me do contrário, que insistam na noção de ser este um caminho para algo mais elevado e glorioso, só consigo vislumbrar a terra. Olhar para o céu é uma mera veleidade que utilizo apenas para absorver as nuvens negras. Nele nunca vi carros de fogo. Nem arcanjos da salvação.

Dizem-me com  extrema assiduídade que não sou realmente ateu. Antes pelo contrário. Que o que defendo e muitas vezes vivo é puro e não adulterado satanismo. Mesmo quando explico que não acredito em deuses. Mesmo quando não aceito a veneração a deuses.

Mas talvez isso não seja realmente necessário. Eu próprio cultivo a ideia do individualismo extremo, mas onde cabem outras pessoas e outras noções. Acredito no egoísmo em  relação a tudo. E mesmo assim entrego-me de alma e coração a quem me aceita e compreende.

Acredito piamente que a raça humana não vai terminar com alegria e que o reino dos céus não se abrirá. Não confio na grande maioria das pessoas e o meu cínismo é um cepticismo permanente.

 

Se calhar não sou um pequeno niilista, afinal. Se calhar sou um satânico. Porque não consigo fingir o meu estado de alma. A minha vontade rir com um papa artista de circo e hábil manipulador de marketing.

Porque não consigo evitar que me assalte o pensamento quando vejo um papa a beijar uma criança, a estender um abraço a uma ovelha fiel: quando será que como dádiva da raça humana recebe um tiro na cabeça? Ou uma faca no pescoço?

Eis que surge aquele brilho nos olhos, como se o seu negro fosse engolir toda a luz. Como se nada mais tivesse importância. Por momentos, essa é uma união. Uma imensa e profana unidade.


Escuridão...  volto sempre a ela. Todos os dias e em todas as danças de uma vida feita de fogo, de bizarros mundos e ainda beijos de desespero e paixão.

Acho que não existe inocência em nada. Nem sequer no sorriso de uma criança. Nem por um segundo pode alguma coisa ser inocente. Não, não quando me sinto desta maneira. Quando o ar se torna, de súbito, cego.

 

 

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Durante aqueles momentos pude olhar para além de mim. Uma imensa necessidade que muitas vezes me consome. Uma inexpressiva vontade de olhar em frente e permanecer intangível como se fosse um maldito fantasma condenado a sentir e não expressar.

Sentado na esplanada, num destes dias sem sol e onde frequentemente se  escutam as pragas dos veraneantes que apenas querem o verão para apanhar sol, com uma cerveja gelada em cima da mesa, vi-as chegar.

 

Foi, desde logo, como visualizar uma fotografia antiga, a preto e branco. Os pelos do pescoço hirtos e um bizarro aperto na face.

Duas mulheres caminhavam ao longo do muro olhando para o mar. Mãe e filha, tais eram as semelhanças. Vestidas de negro como que envoltas num luto. Ambas de cabelo amarrado atrás da nuca. Ambas magras como esqueletos. A mais velha, com um leve tremor na cabeça, como por vezes acenando algo negativo, sentada numa silenciosa cadeira de rodas. A mais nova, de porte estranhamente altivo, caminhava atrás, empurrando a velhota.

Deixei ficar os óculos negros postos, porque me senti absorto e hipnotizado.

Falavam entre si e não podendo ouvir, só podia observar.

Continuaram a andar um pouco mais e por fim, como se não dessem por mim, pararam em frente. A uns três metros em frente a mim, pararam. De costas voltadas, olharam longamente para a praia coberta por um céu côr de chumbo. De baixo de uma aragem fria. Silenciosas.

 

Por fim, a mais nova meteu as mãos na sua bolsa. Retirou uma caixa metalizada e  prateada. Eu só podia sorrir de antecipação.

Com dedos hábeis, pegou num pequeno pedaço de papel branco e espalhou a dose perfeita de tabaco ao longo deste. Com a ponta do indicador direito alisou o tabaco, enrolou um lado da mortalha e passou a ponta da língua pela outra extremidade. Colou-a para fazer um cigarro fino e elegante.

Levou-o aos lábios e acendeu-o. Inspirou e soltou o fumo, consolada. Depois, inclinou-se ligeiramente para o lado esquerdo e colocou o cigarro na boca da velhota que tremia ligeiramente. Fez o mesmo, inspirou e soltou uma nuvem de fumo branco. Enquanto conversavam placidamente, a mais nova foi passando o cigarro dos seus lábios para os da outra e vice versa até acabar. Pareciam uma ilusão provocada pelo cansaço que eu sentia. Surreais.


A mais nova voltou a virar a cadeira de cadeiras e ajeitando o cabelo da velhota prosseguiu em frente.

Eu ainda fiquei mais uns minutos. A boca seca e sem conseguir desviar o olhar.

Por momentos, tudo parece funcionar. Quase se torna palpável um leve sabor a verdadeira existência. Mas, como sempre acontece, muda.

Creio que as conversas denunciam o estado das coisas. Uma sórdida procissão que investe em rotinas e fingimentos. Pequenos artefactos que disfarçam o desespero. Esse desespero que arde e queima, que deixa exausto e vazio.

Talvez eu é que seja realmente louco. Bem posso merecer esse desígnio, mas quando se trocam pedaços da alma por ilusões que desde logo sabemos serem falsas se calhar faz de mim algo um pouco mais, creio eu.

 

Que se possa chamar preenchida a uma vida de anos de companhia podre e atraiçoada por desilusão atrás de desilusões, onde os filhos surgem como uma miserável tentativa de encher um vazio abissal, deixa-me perplexo e ainda assim admiro tamanha capacidade de viver em hipócrisia e em nome de uma suposta e hipotecada felicidade.

Não consigo entender como é possivel viver adiando os sonhos, não sabendo o que realmente significa liberdade pessoal. Nem sequer creio que liberdade pessoal seja uma fuga. Ou sequer resido na ideia de que signifique fazer o que bem entendo. Mas como se pode ser livre vivendo em conformidade com os outros, proferindo as mesmas expressões, ouvindo as mesmas frases e recitando os mesmos gestos todos os dias é pura e simplesmente inálcançavel para mim.

 

Como é possivel sorrir perante tamanha aceitação? Como!!?

Tanta rotina, tanta distorção sensorial e mesmo assim tanto vazio interior

Acredito no elitismo. Na necessidade de escolher, de ter uma opinião pessoal sobre tudo e todos. Um direito meu. Por muito que tal me seja negado.

Mas a cultura comum assim não aceita. Elitismo deixou de ser uma palavra de desígnio e excelência. Uma palavra maldita e excomungada pela grande maioria das pessoas que aprenderam a aceitar o elitismo como um veneno.

Como é que tal se torna possivel? Afinal, todos os dias somos elitistas. Todos os santos dias desta merda de planeta vejo hipócritas que negam as diferenças.

Elitismo é escolher o que acho melhor para mim. Se consulto um médico procuro que seja o  de melhores referências. Cultivo aqueles que acho escreverem melhor, os que pela sua filosofia de vida mais me podem ensinar. Descardo o que considero prejudicial para a minha visão pessoal das coisas. Será isso errado?

Sou elitista e não tenho apreço nem o coração aberto ao mundo que outros tentam aceitar. Escolho os meus amigos e decidi que as minhas paixões seriam restritas, mas quero que sejam uma revelação em todos os dias da minha vida.

Aí reside a estranha ironia; todos os dias dou preferência ao que aceito e escolho. Exactamente o que fazem todas as outras criaturas deste mundo. Mas eu não me envergonho de o dizer. Não tenho receio de escolher a dedo a música que oiço, nem de vibrar com as palavras que me tocam fundo na alma. Admito o elitismo. Outros, uma vasta maioria, não aceita a palavra. Mas são.

 

Um pequeno paradoxo para o caminho da loucura,

 

o esquecimento do som de uma promessa.

 

Não de uma das muitas promessas que ficam por cumprir. Não.

Aquela sussurrada ao ouvido numa noite de escuridão e anticipação. Onde as mãos se unem em frente ao corpo. E as testas se tocam. E os olhos semicerrados, capazes de engolir a alma, se reconhecem como únicos e verdadeiros.

Está feito o caminho. Pejado de sombras e malditas preces que nunca se realizam.

Mas fica aquele sabor, muito para além do suave tilintar dos copos cheios de raiva e amargo sabor.

Permanece aquele calor que desejo. Aquece-me a alma, saber de promessas cumpridas.

Tenho um sério problema com a previsibilidade. Desde sempre, que me bato contra a rotina do dia-a-dia. Em todos os momentos, actos e pensamentos, habituei-me a lutar com o que se torna habitual. Aliás, tudo o que ambicionei e tudo o que ainda pretendo, raramente se pode chamar ou designar por habitual. Normal.

Mas acima de qualquer noção, para além de  qualquer conceito racional, abomino a previsibilidade humana. Quando, pelo mero facto de termos um cérebro que nos  deixa racionalizar muito para além das outras criaturas, o único uso que lhe é dado por uma imensa maioria se baseia na monotonia, ainda cava mais fundo na minha raiva.

 

Todos somos diferentes, creio eu. E ainda bem que assim é! Porque me recuso a aceitar as benesses da igualdade. Odeio o tratamento conforme, que destrói a liberdade de escolha. E só consigo desprezar a maior parte das pessoas que me rodeiam.

Aceito-me odioso para muita gente. Que me tenha tornado imune à incompreenção e que nada do que faço ou digo sirva de chama que ilumina a escuridão. Aceito. Um preço a pagar.

Mas não consigo aceitar a monotonia das pessoas. São tão imensamente prevísiveis. E tão fácil se torna antever o que farão! Porque insistem em ser bonecos, fácilmente comandados e arrastados sem um minímo de resistência da sua parte é algo que nunca percebi.

Queixam-se de má fortuna. Amaldiçoam a falta de compreenção. Parecem esquecer-se de que são absurdamente visíveis. Claramente  distinguidos e maçadoramente monótonos. Basta carregar nos botões certos e são marionetas a sonhar com uma importãncia que realmente nunca tiveram.

"It's in your head [x3]
FILLER
You call it religion
You're full of shit
FILLER"

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