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Para mim a única canção de redenção é aquela que sussurra a certeza da companhia. Mesmo na solidão, partilhar a companhia.

Porque se torna uma batalha diária, manter as mãos firmes perante um caminho que já há muito sei incerto e perigoso.

Existe quem goste de pensar que tudo faz parte da vida. Que somos a parte de um todo e por isso a vida é maravilhosa. Mas que pode isso interessar-me? Porque tento, com todas as minhas forças, emancipar-me de tudo. Talvez seja uma parte de um todo. Mas minha redenção traduziu-se num amealhar de mortes. De ideias e ideais.

Que a vossa mão se torne forte por obra de um ser superior é uma estranha doença para os que são como eu. Pois, que alguns de nós se dedicaram a matar os profetas. E aparentemente, não fiquei mais só. Não. Pelo menos mais só do que já estava.

 

 

Todos os dias são iguais. Em todas as horas pressinto-te desesperado. Aparentemente, tudo parece correr como sempre quiseste. Tu sempre achaste que controlavas os riscos. Mal ou bem tu quase sempre aparentas normalidade.

Posso discordar? Adianto sequer, recordar-te que essa estranha traquilidade não te assenta bem?

 

Por vezes, vacilas. Insistes em ligar para o seu número de telemóvel. Já não existe. Ou está vedado a sonhadores como tu. Nada sei. Apenas que as tuas mensagens de partilha de desespero e amor nunca parecem chegar a ela.

Mas sei o que te deixa os olhos brilhantes: o desejo de ouvir a sua voz. De novo. Nem que seja por escassos instantes.

E tenho notado que desde de alguns meses para cá, tens mais dinheiro. Até pretendes comprar um carro novo! Dizem que amadureceste. Eu não creio em falsas aparências. Quando entro pelo teu apartamento fora, o que sinto é vazio. Mesmo que esteja impecávelmente limpo e arranjado. Mesmo com o topo de gama preso na parede ( onde se encontrava o seu retrato ...), a zonas escuras são cada vez mais presentes. Quase se torna física, a tua saudade. Tão fortemente dolorosa.

 

Substituir o calor humano, o cheiro da paixão por um majestoso ar-condicionado, permitiu controlar o clima e afastar as tempestades? Poder dominar a televisão a teu bel-prazer e dormir no sofá porque receias a lembrança quando te deitas na cama do quarto, foi um preço justo de troca?

Então, a dignidade que aparenta traquilidade e bem estar é apenas um estranho chorar sem lágrimas. Todos os dias são igualmente os mesmos. Passados a viver em desespero pelo que perdeste?

Não consigo deixar de reparar nele, quando entra pelas portas do bar. Trôpego e distante, quase parecendo caminhar debaixo da água.

São sempre as mesmas horas a que chega. Creio que poderia acertar o  relógio, tal é a pontualidade com se senta na mesma cadeira. No mesmo local de todos os dias.

Assenta os cotovelos na mesa. Ombros encolhidos, quase enterrados nas orelhas. O olhar, esse espelho da alma, assemelha-se a uma paisagem lunar, tal é o distanciamento que lhe advinho. Muito raramente e de forma muito suave, gira a cabeça em volta, como por uma necessidade de afastar o mundo.

Quando chega o primeiro copo de vinho, de muitos outros, num estranho e compassado ritual, retira mais um cigarro do maço. Vira-o de cabeça para baixo e bate ritmicamente com ele na parte de cima da sua mão esquerda. Leva-o aos lábios enquanto observa, alheado, o copo à sua frente.

Inspira longamente e depois, liberta uma imensa nuvem de fumo para o ar. Pequenas gotas de prazer e satisfação escorrem pelos seus lábios. Mas por muito pouco tempo. Mesmo muito escasso tempo.

Depressa muda o tempo para os seus lados. De uma forma que não consigo explicar, pressinto-lhe um desespero surdo. Como uma segunda pele, está lá. Batendo com o coração. E os olhos tornam-se gelados, lunares e desconfortáveis.

 

Fico muito tempo, a observar de forma quase solene. Absorto e hipnotizado pela estranha dispersão de sentimentos que dele emana. E vou-me sentindo frio e absorvo um pouco daquele seu desespero. Como se visse um náufrago e a sua salvação fosse impossivel.

 

 

The War is on!

 

A Guerra continua!

 

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