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É tão doce o fim da severidade do olhar quando a luz se reacende num turbilhão que varre o pensamento. E é tão estranha a felicidade que consegue descobrir mesmo o rosto mais inóspito quando a luz e a escuridão se beijam naquele abraço de amantes  reprimidos, nos minutos que sabemos não serem eternos mas escassos como o momento em que descobrimos a nossa capacidade de sonhar, imaginar que o Universo bate dentro do nosso peito.

Estes são pedaços de sombra enamorados no respirar da mais sóbria claridade onde nos recusamos a uma despedida, ao beijo e últimas palavras. Somos animais subitamente deslumbrados por um brilho no olhar que desconhecíamos - por momentos esquecidos que nada brilha para sempre, que tudo o que queremos realmente amar se afoga na condição do tempo curto.

Sim.

Mesmo no mais negro dos desejos existe esta paixão. Mesmo quando os dias são o vidro desfeito onde respiro eu consigo achar-te imensamente bela. Recordar-te em desejos tão ardentes que me calam as palavras e aprisionam os sonhos. Nestes instantes em que respiro contigo, quero ser o idiota que dança e procura as respostas. Mesmo sabendo como a tua beleza é tão quebradiça aceito a tua mão e deixo de acreditar no que outros afirmam em juras escondidas ...

... Que afinal a vida é  apenas um carrossel; que este mundo está cheio de reis e rainhas que insistem em roubar os sonhos; que não, não estou cego, o negro não é apenas o branco e a lua não é simplesmente o sol à noite.

Acho que te vestes solene sem que o saibas porque o meu olhar se perde nessa forma de fustigar os sentidos. 

Acho que a loucura é a tua solenidade envolta num sorriso deslumbrado por um olhar de descoberta.

A minha loucura. O meu olhar. O teu beijo solene.

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Começa por ser um enigma silencioso envolto naquela inquietação de quem tenta balançar as emoções. Nas primeiras horas da madrugada, quando a claridade ainda não consegue rasgar a espessura dos céus negros,  despertam as paixões mais intensas. Viajo trezentos quilómetros de uma ponta a outra sem premeditação, entre questões sem resposta, numa  estranha forma de catarse, incapaz de permanecer imobilizado - traindo os sentidos num sonolento iludir.

Por vezes desperto num outro local como quem acaba de abrir os olhos, ainda mergulhado no espairecer de um sonho, e é a enorme caneca de café negro, a imensa fatia de pão escuro torrado com azeite e o mais saboroso queijo que me devolvem outra realidade. As horas são escorridas num limiar - ora inerte nos pensamentos batidos pelos ventos mais distantes ora desperto em frente ao rebentar das águas e incapaz de calcular as horas que se esfumam.

Este é o estado mais próximo do afastamento total. Uma quase paralisia silenciosa e consentida, entrançada numa qualquer ânsia que ainda desconheço nestes dias. Esta fome inesgotável que me arrasta os passos como se o mundo fosse acabar e com ele se desfaçam os meus sonhos. 

Já não procuro a justificação para esta vontade. Antes deixei que a minha rendição justificasse a sua melodia de sereia. 

E ela continua a segredar promessas quando regresso.

De novo adormecido no berço da distância que vai embalando o meu olhar e a minha paixão por espaço.

 

 

Fica mais um pouco ao meu lado. Mesmo em silêncio. Quero falar-te sobre a minha saudade ...

Sabes, ela não cintila na voz do fado como uma deusa radiante. Nunca a vejo nos poemas mais solenes. Não brilha deliciosa como uma preciosidade que sacia na ausência. 

Quero que saibas que é dolorosa como o tecido de uma cicatriz. Que consegue transfigurar os meus dias e noites como uma corrente no meu pescoço. 

Que não a aceito com o drama da paixão - vivo com ela sabendo que em cada dia que passa vou ficando mais pequeno e moribundo. Os seus segredos não são o sussurrar que desejo. As suas carícias nunca serão a sombra que refresca o meu instinto.

Por isso enquanto puderes, fica. Talvez assim se confunda e eu consiga escapar. 

Ainda não desisti de aprender outras artes de fuga. 

Um dia, eu sei, deixarei que adormeça e sairei para não regressar.

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A necessidade extrema de revisitar locais onde me senti como presente - não um estranho - aparece muito bruscamente. De repente, e demasiadas vezes, violentamente. São por vezes as palavras que me assaltam os sentidos. Como um gesto comedido que consegue abrir uma porta. Às vezes isso basta - uma expressão que se transforma  em olhos que não são meus. 

Talvez seja uma obsessão minha. Talvez.

Mas é  quase mística a essência de quem consegue despertar esta emoção. Um estado de antecipação que consegue acordar em mim uma consciência que não me é estranha. Mesmo que não a consiga explicar não me é estranha. 

São palavras e sentimentos que me recordam a vontade de um dia regressar a onde sei estar o meu lar. A minha casa. Porque por vezes, pareço perder-me nos passos que vou dando em sua direcção. E a imagem desse local a que pertenço quase parece transformar-se em névoa, vou ficando cego. Então, talvez porque alguém desconhece a sua virtude de adormecer desesperos,  aparecem palavras como portentos, sentimentos de familiaridade, pequenos pedaços de luz onde me sinto estranhamente bem-vindo. Gestos amenos, por vezes difusos, como que embaraçados, mas  que pacificam a extensão das minhas ausências e incapacidade de permanecer quieto. Dentro destas passagens escritas permaneço como alguém cuja ausência foi sentida e agora tudo se tornará sereno e tranquilo com a minha entrada. Mesmo que obstinado, traga tantas vezes dentro de mim, pensamentos e Invernos para estes locais que me acolhem é como regressar a casa onde o tempo se torna suave como um vinho envelhecido e saboreado no anoitecer cinzento e frio. Calor para a minha vontade de frio.

E de noite caminho por outras ruas mas não em solidão porque as sinto minhas. Parte da minha casa. Ruas  de onde me afastei por longas semanas mas que sempre habitaram os meus pensamentos. Onde regresso por outras palavras e melancolias, como se assim tivesse que suceder. Com as folhas e os ramos junto aos meus passos. 

Nos dias de cansaço deixo de me debater, gosto de me deitar nestas palavras como quem chega finalmente a um refugio seguro e consegue descansar. Uma estranha criatura vagueando dentro de uma mansão como se fosse sua. 

 

 

 

Acredito com toda a veemência que a saudade não me vencerá.

É preciso que assim seja. Necessito, sinceramente, que assim seja.

Não existe outro método de travar uma forma tão lenta de morte como esta força que vai ocupando o espaço do pensamento que vai embalando a vontade de romper com tudo. Incendiar esta loucura e voltar as costas a onde não pertenço.

///

Está lá, sabes? Quase etérea, no canto do olhar submisso; quase ao alcance de um salto sem falhar. Como um truque de luz e em absoluto repouso, basta um pequeno ruído para que se erga e tudo se transforme. Ainda assim, jamais perde a beleza. Nunca consigo abrandar o meu coração. E os meus punhos permanecem cerrados e brancos. Recordo-me porque não é necessário um deus quando as palavras são segredadas ao ouvido e seladas com um beijo, as mãos nas minhas mãos, as unhas que traçam feridas que eu não sinto, o suspiro quente no meu pescoço. O sabor da saliva. O mais perfeito alinhar de sensações. A certeza de que somos escuridão. Que a noite é nossa. Nossa. 

Orgulhosamente nós neste chão. Além dos olhares e de outras palavras. Animais em observação. Brilhando sufocado na tua luz planetária, e nesses momentos de rara transfiguração os nossos olhos são jóias, e tudo o que fazemos é uma perfeição espontâneas. Onde os deuses gemem temerosos.

Deito-me naquele cansaço de quem batalhou durante horas. Com o coração demente e a arremessar-se contra a parede das minhas costelas. Preso ao toque. Crispado nas saudades e finalmente junto a ti. Deixando desfiar os teus dedos para que o nosso toque seja a alquimia e a paixão que faz explodir, rebentar em fogo primário ou queimar até às cinzas.

O resto não me interessa. 

Que tudo se evapore e negue a si próprio no partilhar deste som doce e melancólico. 

Que este fogo jamais se extinga. 

 

 

///

Demasiadas são as vezes em que as certezas dos outros não são uma resposta, uma entrada  serena para uma outra jornada. São muitas as horas onde parece estalar o chicote de uma razão que não canta a melodia da luz ao fundo, onde acabamos a mergulhar, braços abertos,  numa mentira. Talvez seja esta a verdadeira justificação para prosseguir por outros labirintos, tão estreitos que rasgam os pensamentos mais indomáveis. A amargura que aceita outra verdade, deliciosamente única aos olhos do caminhante, insiste tirana, que voltemos  o rosto para um outro lado mais oposto - tão longe que força os olhos abertos, e acabamos por finalmente reconhecer o verdadeiro nome da escarpa onde terminam certos labirintos.

Por vezes é tão necessário como respirar para sobreviver, que se reconheçam as artes sombrias da punição pessoal escritas numa espécie de catecismo imundo de sangue, onde cada página é nossa - traiçoeiramente pessoal e com as palavras que escolhemos. O meu catecismo é o meu corpo. Os traços do meu caminho estão aí cravados. O nome da escarpa onde terminam muitos dos meus labirintos não aceita apenas a sua casa no pensamento. Não. Comanda que me recorde dele quando me  dispo e deixo que o espelho seja o reflexo de esquissos; memórias e chaves que me recuso a voltar e a usar. Pedaços de escuridão,  pequenas luzes de lembrança onde falhei - mapas para escapar.

Aprendi a esquiva magia da pacificação aqui: no reflexo do corpo tracejado como uma armadura encantada. No uso do verbo como recurso para curar as feridas enquanto caminho no escuro. No escutar de outras melodias por vezes tão estranhas.

Aceitei o seu sabor. Quero deitar-me ao seu lado. Dormir silencioso e sonhar.

 

O que mais custa é deixar que esse sentimento fuja do nosso alcance. É doloroso o esforço de quem tenta agarrar algo ou alguém que se recusa a ficar ao nosso lado. Tudo que fica é um sabor criminoso pelo simples facto de sentir algo. De querer algo. É como ficar arrependido por desejar e ser desejado. Aqui o caos tem o sabor do pensamento dos que desistem por achar que estão errados e a tentar nadar por águas turvas.

Mas talvez algures alguém ainda pense em mim. Se calhar alguém pensa em mim como em anjos e não demónios, enquanto vai usando as cores de uma estranha nebulosa para cobrir o meu corpo. Como uma visão esculpida apenas na mente - um respirar apenas pelos lábios perante um toque. Um pensamento de salvação para mim. Um chamamento silencioso que eu respondo sem lá estar.

Para mim tão cristalino e puro. Tão imensamente raro como aquela gargalhada que carrega consigo o supremo poder da salvação. Tão maravilhosamente delicioso como o conhecimento de que outro desconhece a sua capacidade de cauterizar as minhas feridas. Como pressentir o toque suave da química que afasta a tristeza. Como uma necessidade minha e violenta de oferecer tudo o que está curvado nas sombras.

Sim. Isso mesmo. Porque por vezes tudo é belo. Tudo é violento.

 

 

 

Ômega, diz-me o que sou.

Com os olhos que me conhecem nos meus dias cruzados entre a tua silhueta e a minha vontade de sair daqui. Diz-me desta saudade, que sistemática como Hefesto no seu labor, me vai castigando os dias e as noites. Diz-me onde está a virtude de subsistir, não viver, onde sei não pertencer. Estar tão cinicamente certo da palavra ausência como da raiva que me força a ficar. Ainda a ficar.

As tuas palavras são o absinto, ouves?

São ornamentos do meu medo. Ecos de feridas abertas todos os dias. Caminhos perdidos. Raízes apodrecidas. Animal que reza para que nada nos separe.

Miseravelmente, nada consegue essa separação. 

Não quero dormir. Agora não.

Ômega,  canta para mim.

 

 




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