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Vou falar-te de labirintos estreitos onde se rasgam os ombros nas farpas dos pensamentos. Creio que lhe chamam demónios. Também, algures, outros lhe chamaram Legião. Gosto dessa palavra: Legião.

Porque somos exactamente isso dentro de nós.

Legiões. 

Mas nada temas quando escrevo assim. Não sou realmente eu mas antes o cansaço, esse demónio. Creio que são estes os momentos em que é necessário deixar reclinar o espírito, enquanto espero que se apaguem as últimas luzes da insónia. O cansaço tem destes mistérios, sabes? É enquanto vou deslizando indolentemente para um sono de esquecimento absoluto, na mais cerrada escuridão, que insisto em deixar as portas abertas para outros demónios entrarem. Talvez seja uma semente de esperança, um último desejo, mas resisto a fechar os olhos, a  deixar o desconhecimento de Mim extravasar e percorrer cego os labirintos do meu sono. São estes instantes, que podem ser finais, que mais viajam em mim as saudades e a nostalgia da ausência, como se fossem carrascos de um sonho tranquilo, cósmico, desconhecido. Um delírio de vigília da insónia, antes de entrar na Grande Noite, dirás. Ou então, perdoarás estes ecos e sombras, as Legiões que assolam os locais estreitos do meu adormecer, e sentada na cabeceira, velarás pelo meu descanso.

Fleuma,

 

 

 

A maior das ironias é o mundo em que vivemos. É deliciosamente irónico que, num mundo onde a modernidade abunda, a tecnologia comanda e tudo esteja tão próximo de uma tecla,  ainda assim, nada tenha realmente alterado a nossa capacidade de alterar dogmas. Bizarro, continuamos a insistir nas mesmas ideias do passado. Sempre me pareceram estranhas as noções de globalização, sempre. Nunca vi este mundo como um "grande jardim comum", mesmo sendo alguém que se orgulha de pertencer ao que, carinhosamente, alguns chamam Tribo - porque me sinto protegido e acompanhado. Mas não consigo aceitar um imenso todo, onde todos estão ligados e unidos. Abomino. Lamento.

A  guerra na Ucrânia é um exemplo para mim da falsidade de uma suposta e brilhante caminhada para a globalização. Só uma criatura cega não consegue observar as brechas na armadura deste globalismo, quando uma nação pura e simplesmente rasga todas as regras do direito internacional, todos os princípios mais básicos da suposta Democracia, enquanto vai, todos os santos dias, reduzindo ao mais absoluto ridículo, um parlamento que ainda persiste na arrogância de se julgar "Nações Unidas". É penosa a desunião e aquele assobiar para o lado dos interesses de cada um. Mesmo sabendo os menos esquecidos que essa mesma Ucrânia, nunca foi um exemplo de democracia, mesmo sabendo das gritantes semelhanças entre o regime russo e ucraniano, onde se perseguiam opositores, encerravam jornais,  para não dizer mais.

É falsa a ideia de um mundo onde todos pertencem a algo que se aproxime sequer, de um universo comum, colectivo e próspero. É falso quem alimenta o segmento de irmandade fraterna, porque não somos iguais e devíamos sentir orgulho nisso! A insistência em juntar todos na mesma ordem é uma imposição forçada por doutrinas de esmagamento do Individuo em nome de uma falsa Maioria.

É uma suprema ironia esta teimosia em transformar qualquer Ideologia que seja numa Religião. Mas é exactamente por isso que surgem movimentos transformados em cultos a todas as horas, onde se acusam os que pensam longe deste culto, de preconceituosos, onde toda e qualquer semelhança de autocrítica no interior desses movimentos se revela impossível, onde a insistência mora nisso mesmo: todos pensam igual e assim se anula o Individualismo. Não se lembram que tudo, rigorosamente tudo, parte de um individuo antes de se tornar um todo. 

É ridícula a incapacidade de aceitar uma critica ou um não nestes tempos, como se fossemos crianças imbecilmente mimadas, permanentemente coladas a uma rede social de letras gordas e básicas, sem um pingo de paciência céptica, aceitando tudo como um facto verdadeiro e sem discussão.

Como Individualista temo a retórica que alimenta movimentos políticos de fervor religioso onde se brutalizam os conceitos mais elementares da Biologia,  onde o capricho assume identidades diferentes todos os dias, e principalmente, se usa a culpa como uma arma de punição, que deve ser aceite de cabeça rasa.

Recuso-me a aceitar julgamentos sumários e sentenças conjuradas na culpa de actos passados. 

Não aceito a  Ideologia imbecil que quer forçar a minha submissão pela garganta abaixo. 

Não tenho paciência para os que acham que ser Individualista é uma condição ermita, longe do mundo. É uma ilusão de cinema, quem pensa que aquele que pensa em si antes de olhar para o mundo é um lobo solitário, porque revela o desconhecimento dessa condição, a ignorância displicente do infeliz incapaz de pensar para além do culto do rebanho.

 

Fleuma,

 

 

 

 

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Creio que já tínhamos falado sobre a Morte. Creio bem que sim. Naqueles dias que antecederam o fim do sofrimento, das dores, estranhamente, ao falarmos Dela, finalmente vi um sorriso imenso! Como um intenso momento de lucidez e reconhecimento, aquele olhar distante para uma pilha de comprimidos amontoados, um  abrigo que nunca apagou a agonia, um altar de prostração inútil.

Da tua Morte, estranhamente, e não da tua Vida.E mesmo na viagem, enquanto a morfina viajava entre a tua consciência fria, calculista, racional, e o remoer da minha paixão pela tua virtude de escolher um Fim, o terminar de uma batalha há anos perdida, ainda alimentei a esperança do teu arrependimento.

Idiota.

É como se eu já não soubesse onde saciei a minha sede de mim próprio, desse vigor tão niilista do Individuo, na soberba que me consome, porque escolher o momento e como devemos Morrer é a nossa única e verdadeira preciosidade, que nada ou alguém consegue despojar. Segurar em mim a única centelha realmente minha, torna-me perigoso, sempre o soube. Mas é tão intensamente apaixonante e belo como o teu último e derradeiro pulsar de Liberdade. Afinal, que maior definição de libertação existe senão nesta escolha? Nesse voltar de costas ao tormento, quando assim foi decidido?

E porque escrevo desse dia, logo hoje? Porque me recordei da tua entrada pela porta tão discreta. Porque, após anos e anos de sofrimento e batalha, jamais deixarei que se apague em mim o teu Sorriso, enquanto fechavas os olhos. 

E não chorei. Não me entristeci por um merecido descanso. Disseram-me algo sobre o brilho verde dos meus olhos e ainda algo mais sobre a raridade do meu sorriso, nesses instantes. Já não me recordo. Não me interessa. Recordo-me antes de uma última lição e reverência minha, ao olhar a própria face imaculada da Verdadeira Libertação. Nossa. Intocável. Digna. Decidida por Nós! 

 

... E a canção preferida.

 

Fleuma,

 

 

Εγώ ...


"A presença de um pensamento é como a presença de quem se ama. Achamos que nunca esqueceremos esse pensamento e que nunca seremos indiferentes à nossa amada. Só que longe dos olhos, longe do coração! O mais belo pensamento corre o perigo de ser irremediavelmente esquecido quando não é escrito, assim como a amada nos pode abandonar se não nos casamos com ela." - Arthur Schopenhauer

 

Escrevo para a minha própria salvação. Tudo o que escrevo tem a persistência de uma redenção que nunca será minha - mas insisto que será. Escrever é um método para o Caos, um portão que se fecha antes da entrada no abismo.

Escrever é isso mesmo, a sublime arte do diálogo silencioso interior, as minhas alucinações, os meus caminhos respirados, a mistura de outras terras nos meus passos, os ares das florestas que atormentam os meus anseios. Escrevo porque receio perder-me no esquecimento. 

Talvez essa salvação, essa possível redenção, também sobreviva na voz, no som das palavras, mas esse exorcizar é demasiado breve, para mim. Creio que se torna fácil esquecer quando permitimos que os nossos pensamentos se revelem pela garganta. É impossível que não se tornem miragens.

Não pela escrita. Podemos deixar que o esquecimento arraste pelo pó as nossas conversas solitárias, mas se realmente quisermos, podemos voltar atrás, reler uma página e não permitir a dissolução de certos momentos. E, se mesmo assim, certas folhas escritas forem rasgadas, eu quero que demónios, certas magias, poeiras do meu pensamento, sejam traçadas no meu corpo, onde falo de mim sem esquecimento.

Escrevo porque é irresistível a minha paixão que mergulha em sombras, porque me dispo na escuridão, e onde sei que, verdadeiramente, existe uma alma que pulsa intensa, etérea, alimento, em sementes de amor. 

Esse amor tão meu. Tão vorazmente magno e apaixonado.

 

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Tool,

Alfa e o Omega

Nada está acima, nem o próprio céu!

Tudo está abaixo.

 

Nós não fomos escolhidos. Nós escolhemos este caminho. Nós. Sabemos do sofrimento, da punição da fragilidade corporal, e da condenação a um fim previsto de ossos partidos e dependência de uma cadeira que roda. Nós sabemos disso. Enquanto tanta gente corria apressada, sabíamos dessa sentença, desse paralisar de membros, da perfeita noção de julgamento da nossa carne e sangue pela desesperança. 

Sabíamos.

Mas não aceitamos ser os escolhidos. Não. Nós é que escolhemos estes caminhos de labirintos. Nós vivemos nesta Ilha como lobos famintos, com a Luz ou a Escuridão perpétua nos nossos olhos. Em silêncio, como este Horizonte desolador, violentos como as incessantes vagas deste Mar gelado que nunca adormece. E é nosso o desejo de subir ao Céu, viajar entre os Ventos. Ou então, mergulhar nesta terra até ao seu centro, ao fundo do mundo, como velhos Deuses.

Este momento de compreensão, este bater insofismável do coração que descobre não estar perdido, talvez consiga explicar essa alegria desconhecida que descobre a nossa face. O doce extasiar do sobrevivente. O aceitar do Caos.

 

 






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