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É já quase noite e no despertar de um sono tardio de horas quando a insónia se afastou para um dos cantos escuros do quarto. Quando os sentidos se tornaram claros e lúcidos apareceu uma vontade de reler as palavras de outros - distantes e diferentes.
Mesmo que agora seja uma parede erguida pela tua mão e onde era a tua varanda, ainda que já não existam descrições de passagens nem sequer ecos de passos sobre ideias, reconheço-te as marcas, por vezes taciturnas e, estranho, sem o esquisso da impaciência incrédula perante os dias que correm.
Acontece-me nesses precisos instantes em que pareço regressar da penumbra de um sono pesado e feito de esquecimento, por vezes acendem-se memórias de rostos, de gestos e até de palavras escutadas e lidas, em fragmentos dispersos que eu tento juntar. Uma artimanha minha para segurar a consciência e não voltar a regressar ao abraço da almofada. E mesmo que essas palavras escritas sejam coisa nenhuma para o teu pulso nada lhes apaga aquele breve momento de luz em clarão.
Por isso as retenho em despertar.
(Fleuma)
Raro.
Tão sobriamente raro ...
... como aqueles que não se entregam nas mãos dessa normalidade destes dias, nesse sereno prazer secreto de testemunhar, conseguir "ver", essa armadura de negação a estes dias.
Enquanto cismo nesta ideia, inerte a tudo o que me rodeia, excepto ao clarão das palavras proferidas naquele tom pardo e quase sussurrado, como se mais alto fossem capazes de mutilar, vou bebendo delas embriagado e no respeito de um silêncio por mim próprio imposto. Catártico e sombrio como uma lâmina vai desnivelando a minha ilusão de estabilidade. Ponto por ponto. Racha por racha. Fibra por fibra. Até restarem apenas os filamentos escuros do meu orgulho. Esse animal falsamente aplacado. Essa besta agachada e em chacota que simula na perfeição a domesticação dos seus instintos.
( Fleuma )