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Adormeci ao som de palavras desconhecidas, orgulhosamente ditas por gente mais velha. Adormeci, quando o espírito, mesmo cansado, se recusava a ceder aos feitiços do sono. Para mim, cínico e descrente, teimosamente em fuga de um niilismo cada vez belo, deslumbrar-me nestas palavras tem aquele fulgor intenso e proibido de uma estrela de alva, como uma mortificação antes de um reconhecimento.
Adormeci quando se falava de Fraternidade, incapaz de aceitar o sonho da Igualdade, mas dolorosamente encantado pela melodia desta palavra; disseram-me que adormeci pacificamente, como uma criança, embalado por um feitiço conjurado, brindado, rendido a essa suprema ilusão que habita este miserável planeta, que teima em transformar criaturas imperfeitas em heróis: a Liberdade.
Creio que, por algumas horas de sono, deixei entrar estas e outras palavras afinadas por bocas antigas, com muito mais vida. Como um fantasma entre monólitos desconhecidos, tragicamente perdido, embriagado por portentos de libertação e devoções a uma unidade que me transcende.
E antes de adormecer, mesmo antes de fechar os olhos, como um animal espantado pelo desconhecimento, senti o cheiro perversamente quente, vi o vermelho vampiro, dos cravos amontoados ao meu lado.
Adormeci embalado pela ilusão de outras palavras. Sonhadas. Quase capaz de acreditar nelas.
Fleuma,