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Na última viagem por Paris, mais apressada e nocturna do que nas outras duas passagens, uma espécie de epifania ocorreu nas memórias de uma cidade que não me são queridas - antes dolorosamente pacificadas. Porque se encerram ciclos, quebram amarras e sangram pensamentos, Paris nunca será minha anfitriã; apenas porto de abrigo por dias e noites de entrega a melodias que sei não serem do seu calor romântico.
A mulher acabara de virar as costas para mim. O longo vestido negro riscava os ombros redondos e o pescoço esguio, deixando a pele descoberta; e percorrendo a estrada de carne da ponta do ombro esquerdo ao extremo do direito estavam escritas palavras; artisticamente pontuadas em letras como serpentes - trabalhadas em detalhes negros como catedrais e vermelhos sangrentos como vinhos que turvam o pensamento - " Blut Des Lebens!".
" Je Ne Regrette Rien"
Estas palavras, orgulhosamente marcadas com tinta espessa, descodificaram recordações passadas, arquétipos sombrios ainda presentes. Pensamentos colhidos à beira do abismo, quando a expressão da cidade se revelou pouco amante para os fracos. Dolorosa como o amargo das suas luzes. Carnívora na sua falsa ingenuidade.
" Je Ne Regrette Rien" foram palavras lidas e saboreadas naquele travo amargo e intensamente amoroso que por vezes se transforma num caldo niilista. Uma vénia submissa aos dias passados na mais intensa e reveladora escuridão. Uma passagem solitária onde apenas lamento reconhecer a minha derrota.