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Assumo a minha própria culpa. Joaquin Phoenix é um dos raros artistas que admiro profundamente; creio ser um dos poucos actores realmente tocado por uma genialidade que tantas vezes insiste, matreira, em ser rara, praticamente inexistente, na maioria dos casos na arte do cinema. Lembro-me do receio que senti quando soube que iria ser figura principal no retrato do palhaço inimigo público número um. Porque sei bem no que se tornam certos filmes - principalmente de super poderes.
Depois, porque achei ser tarefa titânica tentar outra aproximação ao palhaço insano e caótico de Heath Ledger - qualquer coisa muito próxima da blasfémia mais extremista. Cioso do que admiro, receoso da possível catástrofe, cerrei os olhos perante o trailer de promoção... descobri que tudo o que seriam as minhas esperanças se confirmaram. E me deixaram a salivar!
"Joker" é tudo o que caminha em linha recta para se converter num elemento de culto. Todos os padrões estão presentes, até na forma frontal com que se afasta das fábulas entre heróis e vilões. Cada imagem, cada ângulo desta obra-prima, existe para deixar o universo inteiro aberto ao talento genial de Joaquin Phoenix. A sua arte corporal é humilhante, exímia na demonstração de quem primeiro caminha curvo e humilhado e depois, erecto e seguro do que vai acontecer. As suas transformações faciais e gargalhadas emocionais não são o reflexo dos seus olhos, dois colossos de gelo inóspito.
"Joker" é uma viagem com principio, meio e fim. Uma arrepiante imagem da transformação onde se instala, com toda a sua pompa, o arquétipo da Sombra; negro e desprovido de lições morais; realista e por isso terrível, porque coloca o acento na ideia de que sim, é possível a qualquer um de nós a transformação pela Sombra. Cada pequena personagem que vagueia na rota do colosso planetário Phoenix é também ela um pequeno monstro sombrio, a ser absorvida numa atmosfera decadente.
A falsa noção de tendência política, defesa das armas ou qualquer outra aberração que ouse afastar este "Senhor" do óscar é perfeitamente respondida no próprio filme: quando se pergunta ao palhaço se a sua atitude tem algum pendor de afirmação política, este responde secamente que não. Que não acredita em nada. E é neste ponto que o filme se torna tão terrivelmente brilhante e assustador - "Joker" é um ensaio absoluto de niilismo agudo à prova de tudo: Uma negação de tudo! Seja político, seja económico e principalmente, seja social. Uma visão sem romantismo estúpido da potência do caos derramado.
Tudo pela mão de um senhor num filme sem grandes efeitos porque quando se é realmente genial deixa de existir espaço para outras estrelas. Negro. Violento. Belo.