Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]
"ERICA BERKOWITZ"
Tem a beleza insofismável. Firme e de maxilares cerrados. Nada comum nas criaturas calmas e alinhadas com a sua própria "natureza". Quando se senta na mesa à minha frente, quando coloca os cotovelos em cima do tampo de madeira escura com a suavidade de um bater de asa, é um reflexo cristalino de uma harmonia em confronto com a minha paixão pelo Caos. Fita os meus olhos de ombros erguidos e queixo que não parece ter sido rasgado pela violência das incertezas. Nunca. Sem a expressão do impacto da desilusão.
Mente.
Sei que mente.
Sei que se inquieta com o meu "sinistro" hábito de inclinar levemente a cabeça para um lado e para o outro quando aguço a minha atenção - "como se fosse um animal desconfiado".
Pior: como se fosse minha a intenção de consumir as suas defesas e predar no mais pleno dos abandonos.
Mas não deixa de ter uma certa beleza a preciosidade do seu jeito ao tentar que nada disto afete as suas impressões. O esforço de me olhar e ainda assim conservar uma distancia segura, como se estivesse a observar pacatamente uma besta enjaulada - fascinada mas segura - firme e de maxilares cerrados mas alinhada com a sua "natureza". Qualquer gesto mais brusco, um agitar mais demorado do meu corpo, agita a fluidez de uma racionalidade nutrida na placidez de quem acredita na sua capacidade de caminhar por labirintos desconhecidos em segurança. Mesmo com os braços esticados como em cegueira.
Falso.
Sei da sua incapacidade para prever as minhas palavras. As minhas emoções que agitam as suas certezas e bom sangue.
Sei.
Pelo fugaz desvio do seu olhar para os lados quando não entende porque não são os meus pensamentos transparentes. Como se, de repente, algo em mim acordasse em si um instinto primário de fuga que existe em todos, mas que a sua educação sempre afirmou superioridade sobre algo tão subliminar. Sou uma incerteza que aparece e desaparece à sua volta como um mau pressentimento, o estalar dos momentos iniciais de uma tempestade.
Uma beleza agitada que corporiza a solidez de uma armadura oca quando as certezas se transformam em sombras indefinidas. E nada é mais doce do que o fino véu de uma frágil segurança que tenta ocultar a inutilidade de um maxilar firme e cerrado.
(Fleuma)