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Acredito no conceito de Caos. Acredito que toda a nossa existência, desde o nascimento até ao momento da morte é estritamente governada pelo Caos. Não se trata de um deus ou de de um destino premeditado. Não creio. Antes a desordem absoluta e onde muito simplesmente pouco importa o que pensamos. Ou a injustiça de nos desprezar. Creio até, que tudo é regido por esta lei subversiva e implacável sem respeito por normas, pensamentos ou acções.

 

É por este Caos que nascemos e é por ele que morremos, mas é durante a fase que atravessa em passos largos o nascimento e a morte que realmente se mede quem e como se batalha no meio deste tirano. Simplesmente tudo, absolutamente tudo, se destrói e volta a construir em nome do Caos. Esta é uma directiva que abala a ciência. Não é uma postura religiosa. É um facto e causa. 

 

Todos sem excepção vivem nesta lei. Todos são os que sofrem destruição dia a dia. Seja por morte de quem se ama, pelo fim de um amor que se pensa eterno, seja pela demolição sistemática de tudo o que levou anos a construir. E todos são os que se voltam a erguer e a reconstruir teimosamente tudo. De novo. Porque este é o verdadeiro sobrevivente do Caos: eis a morte do ente mais querido, do bem  mais precioso; eis a punição por anos de esperança. No entanto, eis a vontade de voltar a reconstruir ainda melhor. Portanto, a mais potente forma de tentar combater o Caos que reina. Mesmo que seja até ao último suspiro, construir o que foi destruído serve para evitar o fim. E quantas vezes não se destrói para melhor construir? Os que desistem de voltar a construir, muitas vezes apenas foram destruidores, não devem ser apontados como fracos. São os que desistem e colocam fim à existência. Seja!

 

A minha convivência diária com este Caos, que tantos pomposamente gostam chamar realidade e natureza das coisas, espelha-se na menina de seis anos, que como muitas outras, sai de mais uma sessão de radiação para superar mais um obstáculo que este pai tirano lhe oferece. É uma construtora que sistematicamente tenta repor o que o Caos lhe tira. Sempre! Mesmo quando a levanto e deixo que apoie a cabeça trémula no meu ombro. Mesmo quando sinto que aquele corpo magro e fragmentado está demasiado quente e os olhos amarelos pela radiação tentam brilhar em triunfo. Consegue. Por muito pouco.

 

Bebo dessa resistência em construir. Partilho o chocolate de noz com ela mesmo odiando nozes. Adormeço muitas vezes ao lado dela quando soluça pela perda do cabelo. Por mim já deixei de verter uma lágrima por este Caos. Antes, a humidade avançava pelos meus olhos sem qualquer consentimento meu. Pura e simplesmente desobedecia. Agora não. Estou seco. Sequei perante os anúncios de mais uma e um que se foram. 

 

Este Caos existe. Uns batalham mais duramente para construir o destruído. Outros perante tal decidem destruir para regressarem mais fortes. Falham muitas vezes. Também conseguem regressar. Nunca iguais. Mas o que realmente me interessa é o caminho percorrido e a forma como é feito. 

 

E todos os miseráveis dias tenho a noção precisa do que custa tentar reconstruir o que é tirado. E que deveria ser nosso por direito.

 

 

 

 

Emil Cioran ...

 

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