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" A saudade não está na distância das coisas, mas numa súbita fractura de nós, num quebrar de alma em que todas as coisas se afundam.”


Vergílio Ferreira

Ás vezes, quando atinjo aquele vazio quase absoluto, com o pressentimento que não posso chegar a nenhum lado por mais que tente, é quando acordar se torna angustiante. Despertar do sono e sentir que tudo à minha volta é doloroso. Levanto-me e se penso em limpar a barba do rosto, faço-o sem me olhar ao espelho, de preferência por baixo de uma luz tosca. Difusa.

A minha própria aparência assusta-me, por estes dias e após as noites de insónia. E o pequeno almoço é muitas vezes um café e um cigarro.

Creio que, como diria o sábio, isto seja o limiar do vazio. Onde tudo dói e se torna doloroso. Ironicamente, o que muitas vezes procuro, esvaziar. Caminhar pelas ruas, como tanto gosto, magoa. Olhar para as outras pessoas torna-se dificil, quase penoso.

 

Não sei explicar a não ser como sendo doente. Carente por abandonar tudo. Fico assim, sempre que sei ter chegado ao fim de algo. Quando este vazio é premonição de passar a página. Sei que este vazio quase absoluto é saudade por quem me espera. Que quando sinto as minhas mãos a ceder e tudo se torna doloroso é pela constatação do quanto odeio este lado do mundo!

Talvez nas margens desta escuridão eu pudesse criar um paraiso real, que realmente fosse verdadeiro; não apenas um local perdido. Creio que teria de ser para além da minha imaginação e razão: onde pudesse florescer a lúxuria, a minha estupidez e invenção. Por onde arrastasse a minha culpa e toda a minha força. Assim sei que esse paraiso se tornaria tão imensamente forte! Quase se torna impossivel anticipar isto, porque afinal carrego o fardo de ver o mundo como realmente é.

 

Eu preciso de dormir e sonhar no meio dos rios. Não preciso de acordar em manhãs sem motivo para despertar. E não consigo acreditar o quanto díficil se está a tornar manter-me por cá! É um triste facto, que por estes dias eu só consiga avançar e persistir por estes lados e ambientes quando penso: Merda! Merda! Vão todos à merda! Foda-se! Vão-se todos foder! Morram!!

Algumas recordações assombram muitas vezes os meus dias. Uma persistente vontade de partir. E como tantas vezes tenho feito, voltar a caminhar pela neve branca como cristal. Longe. No norte da europa. A norte de tudo o que me rodeia.

Voltar a andar pela praia gelada, apenas a ouvir o som do vento frio agreste. Apenas a escutar os passos das minhas botas pesadas. Onde a noite dura meses e os dias de sol não aquecem. São uma miragem.

Estranho, não é? Esta devoção aos "fjords" gelados em oposição ás terras de calor e aos climas de verão. Como me esmagam e matam de saudades, as memórias dos dias que lá passo! Talvez porque sejam porto de abrigo. Novas cores e também estranhas viagens da alma. Acima do sentimento de solidão que busco, para além da noção da finitude - do quanto inferiores somos em relação a tudo - é o tremor e a anticipação de poder pensar e respirar!

 

Ou então, talvez tudo isso seja revelador desta paixão pelo que não consigo ver. Se calhar a escuridão não nasceu para ser recordada. E por consequência retalha e perfura profundamente, obrigando a mergulhar ainda mais fundo nela. É uma depêndencia da qual nunca me canso. Uma escuridão que nunca me satisfaz. Acontece porque algo é retirado para que ela possa ser aceite. Invariávelmente.

Sem poder exprimir por sons, estes são pensamentos transversais ao que resta dos dias vividos. Um perfeito momento. Aquele momentâneo lapso da toda a racionalidade que me faz desejar um dia regressar a casa. Mesmo que não saiba a exacta localização desse local de reverente paz, um dia gostaria de lá chegar. Talvez um sinal destes tempos ou uma estranha mudança na luz, torna-me sedento de estar em casa. Seja como for, casa será aquele sereno momento de boas-vindas, a familiaridade do beijo de compreenção e o calor exprimido pelos que sentiram a minha falta. Acima de tudo, casa será a expressão clara e cristalina das palavras de quem se inquietou com a minha longa ausência e verdadeiramente teve saudades. Quem acha que tudo irá finalmente melhorar, agora que regressei.

Sei ser  a minha casa, pois o outono será brilhante e ameno, pleno daquela promessa misteriosa e sem máguas. E nas ruas vou sentir-me acompanhado. Não perdido e em questão. Serão como sempre pensei que fossem e desde o início quis conhecer através dos meus próprios olhos.

 

 

Um passeio pelo Silêncio ...

 

 

Insisto em manter este silêncio. Recuso-me a deixar que outras palavras, que não sejam as mais míseras migalhas de consolo, perturbem esta calma. Que melhor caminho poderia encontrar? Senão passear por memórias gratas ao meu espirito. Recusando-me a deixa-las também morrer.

Abrir a mente ao que passou tão recentemente, a sombras que ainda aqui se encontram. É como abrir uma porta para um local que já antes foi palmilhado.

 

Mas ignoro os avisos e as práticas quotidianas de sobrevivência. Antes me vale permanecer em correntes. Porque o desejo. Quero manter as recordações. Porque quero. Não por desespero ou solidão - esses são companhia minha  de todos os dias. Nada benignos, nada sensatos. Meus, sem os querer.

É minha única intenção deixar que o desgosto me visite. Mas não o vergar ás lágrimas; existem outros muito mais capazes de chorar. E chorar em silêncio nunca foi de mim.  Se me calo e assim desejo ficar é apenas porque temo que qualquer som, acção ou desejo modifique o exacto local destas memórias. Temo que se assim for já as não consiga vislumbrar. É que nestes últimos dias a  escuridão tornou-se numa madrasta implacável.

 

A tua marca ficou em mim. Vai ficar para sempre. Não porque eu queira e tu o desejasses. Não me atrevo sequer a olhar para a falta que me irás fazer.

Mas a tua morte tornou a minha escuridão mais densa. Um fio corrido  de raiva e frustração. Estranho estado, para quem olha para a morte como o fim absoluto. O terminar de uma existência. E a tua foi plena. E ao mesmo tempo em agonia.

Não mudei a minha visão da vida, já o sabias. Mas os teus olhos imensos, assustados com o pressentimento da morte que tu tanto ansiavas, o teu sorriso cansado da agonia, vai fazer parte de mim para sempre. Até ao fim.

 

E no fim, disse-te ao ouvido, o que me ia na alma. Beijei-te e esperei.

Naqueles momentos, juntei a minha raiva e impotência à tua suprema fé. Aceitei que terias de partir na tua crença. Consolo.

Quebraste as correntes, finalmente. Uma última vez. E alguém me sussurrou ao ouvido que esta seria a tua grande viagem. Para as estrelas.

 

Este silêncio, opressivo e turvo de emoções, não foi desejado por mim. Não hoje.

Porque hoje desejo teu sorriso. A tua gargalhada. O teu olhar de esperança. Sem lágrimas.

Fechei as portadas e procurei o conforto da escuridão. Já estou habituado a ela. A deseja-la e a perder-me nela.

Não obtive conforto. Ou resposta. Apenas a tua face. E o teu cheiro na minha roupa.

Tentei o sol, de olhos cerrados e boca franzida. Não me dou muito bem com esta luz... mas poderia ser diferente, esperar por ti, no calor e na luminosidade. Mais saudade. Mais memórias quentes.

Estar longe de ti não me faz bem. Sempre o soube. Pergunta a cada fibra do meu corpo. Obterás a mesma resposta. Tu. E só tu.

Porque dizes que detesto as pessoas? Que deveria sentir como vibram outros? Acaso troças de mim? Porque nada é igual a ti, percebes? Neste espaço confinado a que chamam alma, só tu mandas! Tudo o resto são ecos. De simpatia. Amizade. Candura. Dôr. Fome. Desilusão. Ódio. Raiva. Ecos.

Tenho pena, mas devo-te a minha miserável vida. Que salvaste partindo-te em migalhas. Crueldade a tua, acho. Não o merecia. Mas tu não pensas assim. Pouco importa. Sou devedor. E também te venero. Tremo quando me tocas. Arquejo no teu beijo. Comprimo, quando me faltas.

Nada me faz realmente falta. A não ser tu. Nada me dá realmente pena. Senão quando estás ausente. Pouco interessa quem caminha neste planeta imundo. Tudo se resolveria, se existisses apenas tu.

 

Aguardo,

espero, por ti.

 

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 "It's time now!

My time now!
Give me my
Give me my wings...!"


 

Sei, que a piedade é apenas para os fracos. Que ela nunca foi o que quiseste. Apenas me custa. Só isso. Afinal sou meramente humano.

Que todos morremos, já o sei. Sabes que não me interessa o que acham outros da morte. O que não sei e nem sequer outras criaturas sonhadoras, é o que é o inferno. Tu sabes. Eu, banhado nos meus caminhos e na minha arrogância, fui testemunha. Os olhos, a evidência, do teu amor incondicional. O combate perdido todos os dias, mais um pouco. E eu sempre mais e mais descrente.

 

Mas creio que agora, que se aproxima o fim, devo exigir as asas da tua fé inabalável. Porque a minha luz não chega para te iluminar o caminho. E está a tornar-se tão difícil ver-te com estas luzes fluorescentes.  Odeio-as, escondem o brilho dos teus olhos. E o teu sorriso cansado.

Mas nada temas. Sei que quando estiveres frente a frente com o teu Criador, o olharás nos olhos. Olha-O e diz-lhe: nunca viveste um mentira! Nunca tiraste uma vida, que fosse! E diz-LHE, antes pelo contrário; salvaste uma!

Agita o punho a  esses portões dourados. Grita, por mim, "Cheguei a casa!"

Ainda assim, por fraca que seja a minha luz, vou deixar que arda. Para que possa ajudar-te no caminho. Ajudar a que chegues a onde eu nunca entrarei. Que chegues sã e  salva. A casa.

 

Deixa que aqui fiquemos, nós, criaturas patéticas, tremendo incessantemente. Sem ti. Segues para um caminho mais alto. Finalmente, de olhos erguidos. Acabou este inferno de fogo e dor. Avisa o Senhor que o seu pilar de fé chegou. Deixando-nos a nós, reles vermes, cegos sem a tua Luz.

 

Hallelujah,

tens finalmente asas!

vais para casa!

Ainda, e porque hoje alguém morreu, fazem 5 anos, aqui fica aquela que era a música da sua vida.

Entre outras... recordar esta traduz-se em algo muito penoso. E escuto-a todos os dias. Até que morra também.

 

"Já morri a morte certa Já senti a fome, aperta a dor Já bati à porta incerta Viajei de caixa aberta, a dor. Pecado, fundido, queimado. Já desci lá em baixo ao fundo Já falei com outro mundo e então Já passei o limbo limpo Já subi ao purgatório e vou. Zangado, bem vindo ao passado Pecado, arrependido, queimado. Zangado, bem vindo ao passado Pecado, fundido e queimado Zangado, bem vindo ao passado Pecado, arrependido, queimado "

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