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A mim sempre me intrigou o que ruminará na cabeça de uma criatura bem pensante quando decide deixar que uma fotografia lhe seja tirada assumindo para isso uma postura que desde logo me aparece como sinistra. Ou antes direi: com uma certa e desesperante languidez. Coisas minhas, creio.

 

Mas pior que languidez, roçando o exasperante, é o jeito  angelical trapaceiro. O forçar do sorriso e logo acima um olhar falsamente encantado, porque os lábios simulam o riso mas os olhos revelam a mentira e a falta de humor. Isto é tão falsamente imposto para a fotografia que roça aquele grotesco embaraçoso e descarado.

 

A própria descontração com que certos seres olham em frente para uma câmara, descaindo o corpo, como que cansadas por labutas inenarráveis que apenas a sua própria essência entende, é profundamente revelador do impossível que é aceitar certas imagens. Por muito campestre e gracioso que se pretenda, é apenas revelador de que outra postura não é conhecida. Apenas a de encantamento. Repetida. Sempre repetida.

 

Mas o que realmente concentra a minha atenção, quando tal sucede, são as mãos. As mãos dizem-me muito sobre outra criatura que respira. E quando parecem clamar por preces, rodeadas por um corpo vestido com trejeitos de um conservadorismo irritante, ainda mais. As mãos juntas, enroscadas uma na outra, perante um sorriso artificial simulam uma criatura distorcidamente angelical, mais parecendo vitima de uma pulsátil dose de opiáceos. São os simulacros de falso humor. As falsas poses de harmonia interior que se revelam inúteis aos olhos de quem atenta nestes pormenores. Até porque a verdadeira paz interior, que inúmeras criaturas iguais, pretendem espalhar não existe. É apenas mais uma queda livre.

 

Intriga-me claro. Que se exiba tamanha incapacidade de olhar o mais do que óbvio. Não engana. Não desafia e muito menos cativa. E então quando essa imagem corresponde ao meu pensamento, isso é ainda mais triste.

 







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